Saiu um estudo interessante sobre o problema da interdisciplinaridade.
Sabe qual é? O medo dos outros.
Vocês me veem sempre defendendo que a interdisciplinaridade é uma habilidade importante para o futuro, principalmente com o aumento da complexidade do conhecimento. Mas sempre que eu posto algo assim, aparece alguém para dizer que na academia ou no mercado é complicado ter esse tipo de perfil. E é mesmo, eu admito.
Eu tenho sorte por estar em um programa interdisciplinar, mas ainda vejo muita resistência no meio acadêmico, que se materializa de muitas formas. Talvez a mais concreta seja por concursos e editais que não aceitam nem sequer áreas correlatas.
Esse tipo de situação pode até soar como um reforçador para um falso pensamento de que os interdisciplinares são menos competentes ou profundos em temas específicos.
Eu sempre neguei isso com todas as minhas forças, mas agora tenho evidências para sustentar o meu argumento. Um novo estudo realizado na Itália mostrou que, na verdade, o que existe é uma reserva de mercado.
Sim, isso mesmo.
Uma espécie de protecionismo do conhecimento. O medo de que outros possam se sentar na sua cadeira mais alta da sapiência.
Até então uma possibilidade investigada era a de que uma pessoa interdisciplinar seria penalizada porque os avaliadores não entenderiam muito bem seu perfil. Isso pode até ser um dos fatores, mas não é o principal.
Utilizando dados de mais de 55 mil currículos italianos, pesquisadores do país encontraram que os candidatos interdisciplinares são penalizados por um outro motivo: ameaçam as fronteiras sociais estabelecidas.
É então que entram em cena os avaliadores, que passam a agir como gatekeepers para protegerem suas áreas e profissões.
E o estudo ainda encontrou que a penalidade de avaliação aplicada aos candidatos interdisciplinares foi ainda maior para os candidatos de melhor desempenho. Ou seja, aquela pessoa boa mesmo era a que mais sofria justamente por ser interdisciplinar.
Por quê?
Porque são pessoas com essas características que ameaçam a distinção e o domínio do conhecimento da disciplina e, portanto, são alvos dos avaliadores.
Está vendo só. Não é que o perfil interdisciplinar seja menos importante, ele só é combatido por desafiar e afrontar o status quo.
Ainda precisaremos de pessoas hiper especialistas para as áreas avançarem em pontos específicos, mas as coisas mágicas acontecem quando os interdisciplinares rompem com as fronteiras.
Esta é a história que estamos escrevendo para o futuro.
Link para o artigo original: A New Take on the Categorical Imperative: Gatekeeping, Boundary Maintenance, and Evaluation Penalties in Science